APLICAÇÃO
DO PERDÃO JUDICIAL FRENTE AO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO
Primeiramente, é necessário esclarecer
que o instituto do perdão judicial não se dirige a toda e qualquer conduta que
constitui infração penal (gênero) mas, sim, aquelas que encontram respaldo na
lei.
Não se pode olvidar que a natureza
jurídica da sentença que concede o benefício é declaratória da extinção da
punibilidade, conforme posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, através
do verbete nº 18, in verbis:
“A
sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da
punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório ”.
É de se dizer, portanto, que se torna
inaplicável por analogia in bonam partem
para os casos em que a lei penal não prevê hipótese de perdão judicial. Em que
pese as razões expendidas, isto se dá, pelo fato que o legislador prevê
aplicação do perdão judicial apenas nos casos previstos em lei, como dito
anteriormente.
Neste passo, cumpre examinarmos a
aplicação deste instituto no Código de Trânsito Brasileiro (lei n. º 9.503/97).
Antes de sua entrada em vigor, quando o condutor de veículo automotor causava
morte ou lesões corporais, era processado e julgado com sanções previstas pelo
Código Penal nos art. 121, §3º e 129, §6º, respectivamente.
Entretanto, com a promulgação do CTB,
foram criados os delitos de homicídio e lesão corporal na modalidade culposa
nos art. 302 e 303.
Logo, o projeto de lei que entabulou o
CTB tinha previsto em seu art. 300 a aplicação do perdão judicial nos crimes de
homicídio culposo e lesão corporal culposa, porém houve o veto desta redação
pelo Presidente da República pelo motivo que as hipóteses dos art. 121, §5º e
art. 129, §8º do CP abrangem o instituto de maneira mais cristalina.
Ao ensejo da conclusão deste fiem,
indaga-se: é possível a aplicação do perdão judicial nos casos de homicídio
culposo e lesão corporal culposa prevista no Código de Trânsito Brasileiro,
mesmo que somente aplicável nas hipóteses expressamente previstas em lei?
É de opinião majoritária o
posicionamento da doutrina quanto a possibilidade de aplicação do perdão
judicial nos crimes previsto no art. 302 e 303 do CTB. Conforme destaca, GRECO:
“Embora
não concordemos com o veto presidencial, pois entendemos que as hipóteses que
possibilitam a aplicação deverão estar expressas, ou seja, deverá haver
previsão legal em cada tipo penal em que seja permitido, pela lei, o perdão
judicial, acreditamos, junto com a corrente majoritária, ser possível, por
questões de política criminal, a aplicação do perdão judicial nos art. 302 e
303 do Código de Trânsito brasileiro. Isso porque não seria razoável entender
que, embora as razões que fizeram inserir o perdão judicial para os crimes de
homicídio culposo e lesão corporal culposa foram, sem dúvida, o elevado número
de acidentes de trânsito, agora que foram criadas infrações penais específicas
para o trânsito, o perdão judicial não fosse aplicado ”.
Em virtude dessas considerações, ainda
há um questionamento que perpetua no mais profundo alicerce da mente dos
criminalistas: A aplicação do perdão judicial é uma faculdade do juiz ou um
direito subjetivo do acusado?
À guisa de exemplo: o marido e sua
esposa estão dentro de um veículo a caminho da residência de seu filho mais
velho para celebrar um almoço de domingo. No meio do percurso sua esposa
solicita para que troque a frequência do rádio pois não está gostando das músicas
que está ouvindo, ao olhar para o rádio, o marido não percebe e atravessa uma
preferencial e colide com outro veículo. Com a colisão sua esposa bate a cabeça
na coluna lateral do carro e vem a óbito no mesmo local.
Tenha-se presente que o exemplo acima
citado é caso de total aplicação do instituto do perdão judicial, visto que a
própria morte de sua esposa já lhe causou sanção suficiente para sua conduta
negligente. Neste caso: qual deveria ser o posicionamento do Estado/Juiz quanto
a aplicação do perdão judicial? Um direito subjetivo do réu ou uma faculdade do
magistrado?
Sob tal ambulação, elucida DAMÁSIO DE
JESUS:
“(...)um
direito penal público subjetivo de liberdade. Não é um favor concedido pelo
Juiz. É um direito do réu. Se presentes as circunstâncias exigidas pelo tipo, o
juiz não pode, segundo puro arbítrio, deixar de aplicá-lo. A expressão ‘pode’
empregada pelo CP nos dispositivos que disciplinam o perdão judicial, de acordo
com a moderna doutrina penal, perdeu a natureza de simples faculdade judicial,
no sentido de o juiz poder, sem fundamentação, aplicar ou não o privilégio.
Satisfeitos os pressupostos exigidos pela norma, está o juiz obrigado a deixar
de aplicar a pena. ”
No que tange ao caráter jurisprudencial,
existem magistrados que reconhecem tal direito e o aplicam ex ofício.[1]
Em remate, é perfeitamente aplicável o
instituto do perdão judicial nos casos dos crimes previstos no art. 302 e 303
do Código de Trânsito Brasileiro, pelo que deve o magistrado analisar e aplicar
o referente instituto como forma de preservar o direito público subjetivo do
acusado.
Guilherme
Abulhosem
Advogado
Criminal
Membro
da Comissão de Advogados Iniciantes da OAB/PR
GRECO,
Rogério. Curso de Direito Penal. 16. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014.
JESUS,
Damásio. E. de. Direito Penal – parte geral, v.1, 2014.
[1] TJPR
- 1ª C.Criminal - AC - 1033171-6 - Cornélio Procópio - Rel.: Marcos S. Galliano Daros - Unânime
- J. 15.08.2013
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